Mudança de paradigmas: a única saída
Universidade Autônoma do México (UNAM)
Civil Society Reflection Group on Global Development
Alejandro Chanona
A dificuldade em alcançar as metas de desenvolvimento e bem-estar humano reside no fracasso do paradigma econômico prevalente, que nos coloca a questão de mudar o capitalismo interna ou externamente. Nossa resposta é internamente. A debilidade dos princípios que sustentam o modelo neoliberal foi comprovada pelas repetidas crises econômicas. Contudo, esses princípios continuam a ser impostos como a única forma para alcançar o desenvolvimento.
Com a publicação da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (a Comissão Brundtland) em 1987, o termo “desenvolvimento sustentável” tornou-se um ponto de referência para a comunidade internacional. Com a Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente Humano e o Relatório de 1972 realizada pela Comissão sobre Questões de Desenvolvimento Internacional (Comissão Brandt) assim como as precedentes, a Comissão Brundtland definiu desenvolvimento sustentável como: “o desenvolvimento que possa atender [as] necessidades da geração presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atender as suas.”
O conceito de sustentabilidade explora a relação entre desenvolvimento econômico, qualidade ambiental e igualdade social. Inclui uma perspectiva de longo-prazo e uma abordagem inclusiva a ação, que reconheça a necessidade de todas as pessoas estarem envolvidas nesse processo.
Contudo, o balanço do avanço desse paradigma apresenta uma enorme lacuna entre o discurso e as ações. Uma revisão dos documentos resultantes das diferentes Cúpulas da ONU sobre desenvolvimento demonstram que desde a Rio-92, o discurso em favor do desenvolvimento sustentável se manteve, acompanhado por noções como desenvolvimento humano e segurança humana.
Isso não significa que a noção foi fortalecida ou que é uma prioridade nas agendas internacionais. Muito pelo contrário: a promoção desse paradigma sofreu vários altos e baixos devido a fatores que vão das diferenças de opinião do Norte e do Sul sobre prioridades e finanças, ou a redução das metas a “um mínimo aceitável para todos”, à primazia da agenda tradicional de segurança desde os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 em Washington e Nova York.
Os países desenvolvidos omitiram a noção de “sustentável” em favor da economia expansionista e da manutenção do padrão de consumo excessivo de suas populações. Enquanto isso, nos países em desenvolvimento, proteger o meio ambiente também não tem sido necessariamente uma prioridade, já que a lógica de primeiro buscar o crescimento e só depois o desenvolvimento, impera. Contudo, apesar do fato de que no marco das Nações Unidas os estados tenham se declarado a favor do desenvolvimento sustentável, não existe vontade política para conduzir um programa abrangente que tornasse possível a implementação em todo o planeta.
Essas circunstâncias devem ser entendidas no marco do sistema internacional que adotaram os postulados neoliberais como paradigma para o desenvolvimento. De acordo com essa visão, a democracia eleitoral e o livre mercado trariam consigo o tão sonhado estado de bem-estar social, e por essa razão, os estados deveriam limitar suas funções a deixar que as forças do mercado atuassem. Esse modelo exibiu suas limitações bem cedo com as repetidas crises e o aumento das lacunas sociais que levaram a globalização a uma verdadeira crise de ética.
A falta de ética na economia internacional, em particular nos mercados financeiros, é também alimentada pela ausência de normas e regulamentações, o que por sua vez alimenta a especulação. O modelo neoliberal favorece a busca pelo lucro fácil de curto prazo, uma situação que é também a raiz das diversas crises econômicas, da distribuição desigual de riqueza, e do aumento no número de pessoas vivendo na extrema pobreza.
O modelo sócio-econômico prevalente no mundo de hoje estreitou sua visão de desenvolvimento humano, que sem dúvida era mais rica quando foram lançados o Relatório Brundtland e as metas da Cúpula da Terra. Hoje, ela encolhe para um mínimo que é mais próximo a uma desculpa moral do que a uma vontade real de resolver os problemas.
Assim, os avanços da agenda do desenvolvimento sustentável têm sido graduais e limitados. Dependem diretamente da vontade política dos estados, não só para chegar a acordos quanto aos objetivos, recursos e cronogramas, mas também para sua implementação, avaliação e acompanhamento. Os países desenvolvidos apostam em metas e objetivos mínimos, e ao mesmo tempo evitam estabelecer metas e compromissos específicos mais ambiciosos e inclusivos.
O crescimento econômico e a estabilidade monetária per se não são equivalentes a menos pobreza. Enquanto os problemas estruturais da distribuição desigual da renda e da riqueza não forem resolvidos, será muito difícil avançar na luta contra a fome e pela redução da pobreza, diminuindo a capacidade de alcançar as Metas de Desenvolvimento do Milênio, ou quaisquer outras metas nesse sentido. É importante salientar também que um aumento na AOD (Assistência Oficial ao Desenvolvimento) é imprescindível; se o que realmente se quer é reduzir as desigualdades atuais, são necessários indicadores mais precisos para avaliar a pobreza no mundo. O problema é que todo o sistema de monitoramento e indicadores é parte do atual paradigma de crescimento econômico e seguem o mesmo discurso.
A comunidade liberal da qual o mundo de hoje é parte, e sua visão de economia mundial, tem gerado uma narrativa na qual os indivíduos interpretam seu entorno e atribuem significado às suas condições de vida particular e social. Por isso é tão importante mudar essa narrativa, para permitir que os líderes mundiais, chefes de estado ou governo, reformulem sua interpretação da realidade e consequentemente a maneira como definem e avaliam as políticas públicas.
Por isso uma mudança de paradigma deve ser acompanhada por um marco discursivo-conceitual renovado, assim como novos indicadores para medir o bem-estar social. Qualquer medida de avanço em desenvolvimento e bem-estar social tem que ir além da metodologia limitada à visão econômico-monetarista que reduz um fenômeno complexo e multidimensional como a pobreza a um constructo conceitual estreitado a partir do qual são derivados indicadores mínimos. Por essa razão, a discussão sobre a definição de novas metas de desenvolvimento deve continuar, para que possam ir além das categorias de crescimento econômico. É necessário um novo conjunto de indicadores de pobreza e de outros parâmetros que possam significar uma profunda redefinição na sociedade internacional, no Estado, e na própria humanidade.
A atual crise do sistema internacional como um todo abre a possibilidade de repensar a relação entre estado e mercado, e o paradigma neoliberal que prevalece há várias décadas. Como apontou o Relatório Brundtland, “Desenvolvimento sustentável, em última instância deve residir na vontade política dos governos quando decisões econômicas, sociais e ambientais críticas tiverem que ser feitas.”