Justiça Intergeracional: satisfazendo necessidades ao invés da ganância
C.J.George
Coordenador Regional - Sul da Ásia
Terre des hommes, Alemanha
O conceito de justiça intergeracional foi introduzido em 1974 pelo economista James Tobin, que escreveu: “Os administradores de instituições detentoras de patrimônio são os guardiões do futuro contra as reivindicações do presente. Sua tarefa, ao administrar esse patrimônio, é preservá-lo entre gerações.”[1] O uso insustentável de recursos naturais leva à injustiça intergeracional.
Colocando-nos sob a perspectiva do todo coletivo, é fácil argumentar que somos obrigados a nos preocupar com o destino das gerações futuras. Mas a pergunta é como e até que ponto nossas ações e decisões atuais devem estar orientadas pelo futuro. Cada geração deve reservar uma quantia adequada de capital em retorno pelo que recebeu de gerações anteriores, permitindo que a última desfrute de uma vida melhor em uma sociedade mais justa..
Já que apenas a posteridade pode demonstrar os frutos de nossos projetos ou contribuições, não podemos realizá-los com base em relações contratuais. Enquanto a geração atual pode assumir algum compromisso para o futuro, o futuro ainda não chegou e não pode ser parte do contrato. É nesse sentido que a idéia de comunidade se torna útil. É dentro de uma comunidade que membros do coletivo encontram "um sentimento de identidade que é disseminado ao longo do tempo." Como essa comunidade existe nas esferas local, nacional, regional e global, a preocupação com seus membros futuros também deve ocorrer em todas essas esferas diferentes.
Assim, as considerações de justiça se aplicam a relações que vão além das atuais. Isso é especialmente verdade no caso da justiça distributiva. Até certo ponto, a geração de hoje exerce poder sobre as futuras e tem a possibilidade de esgotar os recursos de tal maneira que negue os direitos das gerações futuras. Não há como o futuro controlar o presente. Além disso, a geração atual exerce poder até mesmo sobre a existência de gerações futuras. Essa seria uma influência ainda maior do que a que ocorreu sobre a geração atual, onde a influência poderia, no máximo, afetar a sobrevivência das pessoas. Esses são argumentos suficientes para declarar os direitos de pessoas do futuro, embora possa haver alegações contrárias.
Outra tentativa de definir gerações futuras foi feita pela Universidade de IDWA em sua tentativa de reconciliar os interesses humanos com os da Natureza, que são distintos, porém inseparáveis. A socióloga Elise Boulding propôs que 'gerações futuras' podem ser definidas com base nos "200 anos do presente", que é o período de tempo que se inicia 100 anos no passado e se encerra 100 anos no futuro, a partir de qualquer data do presente.
A Rio 92 adotou vários tratados ambientais de cunho jurídico, particularmente a Convenção Marco da ONU sobre Mudança Climática (UNFCC) e a Convenção sobre Diversidade Biológica de 1992.
A reunião destacou a justiça intergeracional ou equidade como um princípio fundamental de todas as preocupações ambientais e do desenvolvimento. Isso foi aceito por todas as nações participantes. Reconheceu-se que os direitos de gerações futuras têm de ser respeitados enquanto se busca atender as necessidades das gerações do presente. Esses reconhecimentos foram trazidos ao campo das políticas e leis pelas nações anuentes.
Reuniões subsequentes, como as de Johanesburgo em 2002 e Copenhague em 2009 não inspiraram muita confiança entre as pessoas do mundo todo. A conferência mais recente, em Cancún, até arriscou negar os possíveis ganhos remanescentes dos acordos do protocolo de Kyoto.
É urgente a conquista de uma relação sustentável entre a natureza e os seres humanos para o benefício de gerações futuras, incluindo crianças. Conforme enfatizado pelo Secretário Geral da conferência Rio+20, Sha Lukang, duas décadas não fizeram que o mundo estivesse mais próximo da erradicação da pobreza; pelo contrário, o mundo mergulhou na crise ambiental e na mudança climática. E será essa pobreza ambiental que as gerações futuras irão herdar.
A Conferência Rio 2012 deve reiterar a convicção de que o desenvolvimento sustentável baseado no crescimento equitativo, econômico e social e na preservação ambiental se opõe ao desenvolvimento baseado puramente no crescimento econômico. Muitas vezes se alegou que a Rio 92 foi totalmente voltada a apresentar as questões de sustentabilidade à sociedade civil e ao setor corporativo. A Rio 2012 deve agora fazer com que os governos tomem medidas. O desenvolvimento sustentável, incluindo os direitos de gerações futuras, só pode ser conquistado por meio da governança global transparente e não através de um regime de mercado livre.
A riqueza de conhecimento e experiências que surgiu desde a Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança (UNCRC) precisa ser compreendida no contexto dos direitos da criança. O fenômeno amplamente discutido do aquecimento global antropogênico e mudança climática, agravado pela perda da biodiversidade, ameaçam o planeta Terra em um nível sem precedentes, e irá afetar as gerações futuras, incluindo as crianças de hoje e aquelas que ainda estão por nascer. Isso exige instrumentos globais que sejam legalmente implementados e dedicados a defender os direitos ecológicos de gerações atuais e futuras, incluindo uma campanha para reconhecimento dos direitos ecológicos de crianças e muitas outras iniciativas.
Qualquer outra medida a ser tomada deve ser acompanhada de instrumentos com valor legal. Temos de permitir o futuro, conforme afirmado por Antoine de Saint-Exupéry: "Sua tarefa não é de prever o futuro, mas sim de o permitir."[2] Isso só pode ser conquistado através da criação dos mecanismos adequados e, nesse caso, a proposta do Conselho Mundial para o Futuro de nomear "uma representação legal ou um Guardião" é interessante.[3] Alguns países já possuem esse tipo de instituição. A definição de um Ombudsperson internacional ou a organização desse tipo de esforço nacionalmente pode ser uma realização concreta da conferência Rio 2012 na sua jornada pela sustentabilidade e concretização do futuro, o que resulta na garantia da justiça intergeracional.
[1]J. Tobin, “O que é Receita do Patrimônio Permanente?” American Economic Review 64, (Maio 1974).
[2] Antoine de Saint-Exupéry, Citadelle (The Wisdom of the Sands), (Paris: 1948).
[3]Citado no Conselho Mundial para o Futuro, Protegendo nosso futuro: Como incluir as gerações futuras na definição de políticas, <www.worldfuturecouncil.org/fileadmin/user_upload/PDF/brochure_guardian3.pdf>.