Desenvolvimento sustentável na região Árabe

Rede Árabe de ONGs para o Desenvolvimento (ANND)

As revoluções e revoltas dos povos Árabes que eclodiram inicialmente na Tunísia em dezembro de 2010 constituem a base para a correlação entre desenvolvimento sustentável, governança democrática e liberdade, enquanto a região Árabe continua a vivenciar guerras, crises e conflitos como resultado da violação de leis internacionais e da incapacidade de implementar as resoluções internacionais acordadas. É óbvio que a paz justa e sustentável nessa região não será conquistada a menos que o direito do povo Palestino à autodeterminação seja respeitado.

Às tensões regionais, agrega-se o fato de que a água, o mais estratégico dos recursos naturais nessa região árida, está sendo administrada de maneira equivocada. A maior parte do suprimento de água dos países Árabes depende de processos custosos que fazem uso intenso de recursos energéticos, exaurindo outros recursos naturais. Isso ocorre em função da falta de expertise e supervisão nas esferas nacional e regional. A gestão de recursos somente pode ser aprimorada com a garantia de que o acesso à água doce permaneça como um direito humano básico.

Dessa forma, é essencial reavaliar as políticas existentes sobre uso da água e geração de energia para garantir que os recursos esgotáveis sejam utilizados de maneira justa e sustentável. Investimentos e cooperação inter-regional nesse campo também devem ser ampliados.

Medidas devem ser tomadas para garantir que o conceito da economia verde não se torne um retrocesso dos compromissos assumidos na Agenda 21, um dos principais resultados da Rio 92, mesmo que seja usado para dedicar-se a uma nova abordagem para conquistar a sustentabilidade global. Essa abordagem deve estar fundamentada em uma compreensão mais abrangente do desenvolvimento sustentável, que inclui a revisão de tendências globais de produção e consumo e priorização de direitos, igualdade, justiça e responsabilidades comuns, porém diferenciadas.

Políticas de energia não sustentáveis e mal gerenciadas exacerbaram a mudança climática, além de colocar em risco a segurança alimentar e da água em decorrência de certas tecnologias, como os biocombustíveis de primeira geração que criam uma impressão falsa de compensação entre energia e alimentos. A adaptação cada vez mais presente a técnicas sustentáveis favoráveis ao meio ambiente, como energia solar ou eólica, incluindo investimentos públicos e privados nesses campos, é essencial.

Uma parceria global revitalizada para o desenvolvimento sustentável deve abordar o tema da governança global, incluindo a forma como o comércio, investimentos e relações financeiras muitas vezes favorecem os países ricos à custa da subsistência de países pobres, e desviam os recursos que deveriam ser dedicados ao desenvolvimento e a objetivos vinculados aos direitos. É fundamental, portanto, reavaliar políticas e acordos comerciais que estejam na contracorrente da meta do desenvolvimento sustentável, e também abordar o desequilíbrio estrutural do poder na economia global que privilegia poucos.

É também crucial revisar e alterar políticas que moldam e apóiam - ou deixam de apoiar - o desenvolvimento sustentável, incluindo, por exemplo, as que tratam da soberania e segurança alimentar, assim como as relacionadas a novas tecnologias e transferência tecnológica. Isso ajudaria a abordar a ameaça aos ecossistemas e à biodiversidade imposta pela degradação da terra e pela poluição da água. Com relação a novas tecnologias, a aplicação do "princípio da precaução" é essencial para evitar os riscos e desafios de tecnologias não comprovadas.

A incidência da pobreza está aumentando em paralelo ao crescimento econômico na região Árabe, como acontece em outras regiões. A pobreza é mais preponderante entre populações rurais, cuja subsistência muitas vezes depende da agricultura. Os legisladores priorizaram a integração na economia global por meio da desregulamentação econômica, incluindo a liberalização do comércio e investimentos, financiamento de dívidas, privatização e parcerias público-privadas. Isso enfraqueceu ainda mais os países em desenvolvimento, aumentando sua dependência de importações de alimentos e exacerbando sua vulnerabilidade a choques externos.

É óbvio que o papel do Estado em assuntos econômicos precisa ser reconsiderado para equilibrar sua função como regulamentador e facilitador contra o papel do mercado num ambiente de crescimento econômico contínuo. Os países em desenvolvimento precisam abandonar o enfoque exclusivo no crescimento econômico e migrar para um modelo econômico baseado em uma perspectiva amplamente baseada em direitos.

Tanto os países desenvolvidos como os em desenvolvimento precisam de instituições fortalecidas que atuem nas esferas intra-regional e intra-temática, com foco na “governança participativa” que opera de baixo para cima. Maior coordenação e cooperação em torno do desenvolvimento sustentável são necessárias entre comissões regionais, fundos, programas, agências e bancos de desenvolvimento internacionais, em conjunto com instituições da ONU.

A mobilização da assistência técnica e financeira deve facilitar a implementação de programas e projetos de desenvolvimento sustentável acordados nos níveis regional e sub-regional, com ênfase no fortalecimento de participantes locais. Isso, por sua vez, depende de instituições governamentais sólidas que sejam transparentes e responsáveis perante todas as principais partes interessadas.

Por meio de estruturas de coordenação nacionais e locais, as instituições governamentais devem também promover a plena participação pública na formulação e implementação de políticas de desenvolvimento sustentável. Qualquer tipo de implementação exige políticas e mecanismos que garantam o envolvimento dos atores locais, de diversos grupos da sociedade civil e representações, incluindo as mulheres, os povos indígenas e as pessoas com habilidades especiais, que passam a ter o poder de tomar decisões e implementá-las, visto que muitas vezes estão diretamente envolvidos.

É crucial que o processo da Rio+20 resulte na adoção de compromissos acordados internacionalmente, com prazos estabelecidos e estratégias claras para atingí-los. A conferência deve esclarecer as responsabilidades de instituições globais de governança, incluindo agências da ONU, o FMI, o Banco Mundial, a Organização Mundial do Comércio, e outras, para a conquista das metas acordadas.  O nosso apelo é que se estabeleça um "Conselho para o Desenvolvimento Sustentável" equivalente a instituições como o Conselho de Segurança, o Conselho dos Direitos Humanos e o Conselho Econômico e Social, com a autoridade de monitorar a implementação de iniciativas nacionais para o desenvolvimento sustentável por meio de resoluções com vínculo legal.