Os indignados estão fazendo as perguntas certas sobre o futuro da europa

Mirjam van Reisen
Universidade de Tilburg
Simon Stocker e Georgina Carr
Eurostep

Em outubro de 2011 os indignados de Madri foram a Bruxelas para compartilhar suas preocupações e abordar questões sérias. Uniram-se a eles pessoas de outros países europeus que também foram inspiradas pelo livro de Stéphane Hessel’s, Indignai-vos! (Indignez-vous! título original em francês). Hessel, um homem de 93 anos que fez parte da resistência durante a II Guerra Mundial, faz um apelo a seus leitores para que defendam os valores da democracia moderna e rejeitem o poder “egoísta” do dinheiro e dos mercados.[1] Esses valores estão incorporados na constituição das Nações Unidas como uma forma de mediar conflitos, na proclamação da Declaração Universal dos Direitos Humanos e no estabelecimento da União Européia.

Os indignados vieram questionar o que a Europa tem a lhes oferecer. Com um a cada dois jovens espanhóis desempregados, era natural que buscassem respostas. O Presidente da Comissão Européia José Manuel Barosso reconheceu que enfrentava uma época especialmente difícil em seu discurso do Estado da União de 2011 para o Parlamento Europeu, afirmando: “Hoje, estamos nos deparando com o maior desafio que a nossa União já testemunhou, em minha opinião, em sua história.”[2] Ele alertou que países poderiam deixar de fazer parte da União Européia e que haveria um movimento reverso na direção do nacionalismo. Duas semanas antes, o Ministro da Fazenda polonês havia alertado o Parlamento que um colapso da eurozona levaria provavelmente à ruptura da União e à perspectiva real de guerra na Europa dentro de 10 anos.[3]

Os indignados estão certos em questionar se nossos líderes estão fazendo as perguntas corretas ou se estão fazendo perguntas da maneira correta.  

 

Atualmente, a Europa está restrita a dois discursos primariamente conservadores. Um deles se origina da ansiedade dos cidadãos e líderes nacionais, que consideram que a UE não mais os beneficia e desejam retornar à primazia de uma estrutura primária de identidade e políticas nacionais. O segundo deles, liderado por um setor corporativo que necessita desesperadamente de uma EU que possa competir a nível global, baseia-se no medo das conseqüências devastadoras que um colapso poderia trazer.  

O que falta em ambos os discursos é o conceito de uma União Européia que beneficia seus cidadãos e contribui para um melhor entendimento entre os países da região e para a paz e prosperidade de todos. Ao mesmo tempo em que a EU baseou-se em uma abordagem que integrava as dimensões econômicas e sociais, a dimensão social já não faz parte do discurso dominado pelo “interesse próprio,” pelas “necessidades” da Europa e pelo “poder competitivo” da Europa. A ênfase no lucro a curto prazo em vez da sustentabilidade econômica a longo prazo representa uma traição ao coração e à alma da Europa, e também coloca em risco o objetivo de uma política econômica que pode ser sustentável e beneficiar todos.

O desenvolvimento econômico da Europa cada vez mais vem sendo impulsionado pelo consumo e depleção de recursos globais,[4] resultando em geração de riqueza para a região, acompanhada, entretanto, de degradação ambiental interna e externamente à região. Boa parte desse desenvolvimento contou com a aquisição de recursos em outros países e baseou-se em ações de interesse próprio na arena dos negócios e comércio.  A Estratégia de Lisboa foi adotada em 2000 com o objetivo declarado de tornar a União Européia “a economia baseada em conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo, capaz de promover o crescimento econômico sustentável com mais e melhores empregos e maior coesão social” até o final da década.[5] A Estratégia visava expandir o crescimento econômico por meio de políticas avançadas para a sociedade da informação, reforma estrutural para promover a competitividade e inovação e investimentos adicionais em pesquisa e desenvolvimento. A modernização do modelo social europeu, o investimento em pessoas e o combate à exclusão social também constituíam metas definidas.  

Entretanto, no final da década o crescimento econômico havia declinado ainda mais, e ainda que as taxas de emprego estivessem ligeiramente acima dos níveis inicialmente registrados, estavam bem longe da meta geral de 70% de pessoas empregadas.  Em termos gerais, foi amplamente reconhecido que a estratégia havia falhado. A crise financeira global de 2008 foi um fator que contribuiu para o insucesso, porém, mesmo antes do colapso financeiro, estava claro que a Estratégia de Lisboa não iria cumprir sua ambição de tornar a União Européia a economia baseada em conhecimento mais competitiva do mundo.  

[1] J. Lichfield, “O pequeno livro vermelho que varreu a França,” The Independent, 3 de janeiro de 2011. Disponível em: <www.independent.co.uk/news/world/europe/the-little-red-book-that-swept-france-2174676.html>.

[2] J. M. Barosso, Presidente da Comissão Européia, “Discurso do Estado da União de 2011,” 28 de setembro de 2011. Disponível em: <ec.europa.eu/commission_2010-2014/president/state-union-2011/index_en.htm>.

[3] L. Phillips, “Polônia alerta para o perigo de guerra em 10 anos enquanto os líderes da EU se desdobram para conter o pânico,” 14 de setembro de 2011. Disponível em: <euobserver.com/18/113625>.

[4] O WWF afirmou que a UE e outras regiões de alta renda estão usando cinco vezes a quantidade de recursos naturais utilizada por países de baixa renda (“Contribuição do WWF para a consulta pública sobre a posição da UE para a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável em 2012 ,” Abril de 2011).

[5] ESIB – Sindicatos Nacionais de Estudantes da Europa, “The Lisbon Agenda: An Introduction,” Bruxelas, 2006. Disponível em: <www.esib.org/documents/publications/official_publications/lisbonhandbook.pdf>.


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